segunda-feira, 16 de novembro de 2009

AS IDEOLOGIAS NAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

Acadêmica: Jucineia Narciso dos Santos

Na sociedade em que vivemos circulam diferentes formas de expressar um pensamento, além de livros escritos em prosa, existem as histórias em quadrinhos. Geralmente este recurso é utilizado para atingir o público infantil, adolescente, mas não deixa de compor o acervo literário de muitos adultos.
As histórias em quadrinhos apresentam uma estreita relação com a realidade social, além da função de lazer e entretenimento. De acordo com Aranha e Martins (2000, p.46), “além da função de entretenimento e lazer, tem também a função mítica e fabuladora característica das obras de ficção e ainda preenchem funções estéticas, pois se trata de uma nova linguagem artística”.
Neste contexto, é importante refletir a cerca da ambigüidade apresentada pelas histórias em quadrinhos, ao mesmo tempo em que pode servir a consciência, serve a alienação, tanto pode levar ao conhecimento, tanto é criativo como também paralisadora.
As histórias em quadrinhos são muitas vezes utilizadas como recurso de leitura em salas de aula, principalmente com turmas dos anos iniciais. Desta forma, cabe ao professor conhecer este tipo de linguagem e antes de levar para os alunos é imprescindível que faça uma análise sobre as ideologias presentes, para que possam refletir sobre as leituras de modo a despertar nas crianças o senso critico, pois segundo Ariel Dorfman e Armand Mattelart, a leitura das histórias em quadrinhos não era tão inocente assim como se pensava.
Este tipo de texto é marcado por ideologias refletindo o sistema presente na sociedade, podendo criticar as formas de discriminações ou perpetuar as diferenças sociais, fazendo com que as pessoas naturalizem as desigualdades ou as formas de vida alienando-se na conformidade e passividade política. Pode-se citar as histórias em quadrinhos da turma da Disney, onde a sociedade é representada uniformemente, estática e harmônica, sem diferenças de classes, mostrando situações que são a negação do cotidiano, do dia-a-dia de cada pessoa. Aliás, parece que algumas personagens não trabalham nunca, e não sabemos muito claramente de onde vem o seu sustento. Geralmente, a classe proletária não é representada por nenhuma personagem da mesma forma que a vida no campo é enfatizada sobretudo no aspecto do lazer, e não da produção.
Contrapondo estes aspectos podem-se analisar as tiras da Mafalda onde há a sua volta uma pequena corte de personagens mais “unidimensionais”: Manolito, o menino plenamente integrado num capitalismo de bairro, absolutamente convencido de que o valor essencial no mundo é o dinheiro; Filipe, o sonhador tranqüilo; Susanita; a doente de amor maternal, perdida em sonhos pequeno-burgueses. E, depois, os pais de Mafalda, resignados, que aceitaram a rotina diária e, além disso, instigados, provocados pelos questionamentos da Contestadora Mafalda que não aceita as condições impostas pela sociedade.
As tiras da Mafalda, “Criança rebelde”, escrita e desenhada por Quino, humorista argentino, é conhecida além do público argentino, ultrapassando fronteiras chega no Brasil e outros paises. Nestas tiras Quino revela a idéia da menina atrevida, que possui ideais políticos e questiona o papel da educação revelando muitas críticas à escola.
Segundo Umberto Eco, “Mafalda é o personagem dos anos sessenta, podendo ser definida como contestadora, uma heroína “ enraivecida” que recusa o mundo tal como é”. A personagem pertence a um país repleto de contrastes sociais, demonstra idéias confusas sobre política e mostra-se insatisfeita com o sistema. As histórias em quadrinhos assumem a função questionadora de costumes, onde Mafalda reflete a tendência de uma juventude inquieta.
No olhar da Mafalda a sala de aula é representada por meio de uma educação tradicional, onde o professor é o centro do processo educativo, até as carteiras são dispostas em filas com os alunos sentados um atrás do outro. Há muitas criticas a respeito do processo de alfabetização. Mafalda se incomoda com as leituras que a professora lhe indica e reflete o porquê não escrevem livros com a linguagem das crianças?Pois é obrigada a ler frases sem sentido como, por exemplo “Ema vê a mesa da sala de estar”, sendo que estes tipos de leitura não acrescentam nenhum tipo de conhecimento a não ser a decodificação das letras. É de se pensar por que não alfabetizar com leituras que façam sentido e tenha significado para o aluno.
A escola, nas histórias em quadrinhos da Mafalda, aparece como lugar pouco atrativo e cansativo. Muitos dos amigos da Mafalda resistem em ir para a escola.
As criticas aos professores e ao currículo são acentudas, mostrando que o conteúdo trabalhado na escola não condiz com a realidade social. Susanita fica possessa em ter que preencher uma página de risquinhos e reflete que com professores deste tipo o país jamais irá para frente. Mafalda quer aprender a ler jornais e quer saber o que está acontecendo no mundo e é obrigada na escola aprender coisas sem sentido desconectada da realidade.
As tiras da Mafalda mostra o descontentamento com a educação e alerta para a necessidade de um redimensionamento da função da escola, para que ocorra uma transformação do meio social repleto de contrastes sociais, já que estamos vivendo em uma sociedade em constantes avanços tecnológicos, citadas por muitos autores como a sociedade do conhecimento e da inovação.
As tiras da Mafalda nos provocam a questionar sobre o que fazer quando vivemos em uma sociedade repleta de contradições, denominada “ sociedade do conhecimento”, contrastando com a marginalização de muitas pessoas, que buscam na sociedade da sobrevivência manter-se vivo.
Esta é a contradição da educação para classe trabalhadora! Que educação estamos oferecendo às crianças? Que escola? Que concepção de ensino e aprendizagem fundamenta nosso trabalho? Ou ainda, como lidamos com as “Mafaldas” que existem na nossa sala de aula?
São nas contradições criadas pela sociedade capitalistas que podemos criarmos espaços de resistências e construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Para tanto, precisamos deixar renascer em cada um de nós o espírito contestador da Mafalda.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARANHA, Maria Lucia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filisofando: introdução à filosofia.2 ed. São Paulo: Moderna,1993.
QUINO. Toda a Mafalda; [tradutores Andréa Stahel M. Da Silva...et. al.]. São Paulo: Martins Fontes,1993.

sábado, 5 de setembro de 2009